de Plebeias a Princesas e Rainhas14
especial talvez pelo peso do passado que carrega no seu nome, mas banal nos seus
erros e desaires. Veja-se Juan Carlos de Espanha, como conseguiu desbaratar todo um
capital de respeito consolidado durante décadas, por razões por demais sabidas. Não
fora Letizia, a plebeia jornalista e divorciada, a colar os «cacos», impondo-se com fir-
meza a uma aristocracia que sempre a olhou com desdém, e talvez a monarquia em
Espanha tivesse os dias contados. Felipe, na altura príncipe herdeiro, não a conhe-
ceu num banquete feérico, antes num comum jantar de amigos. O amor que, entre-
tanto, nasceu entre os dois ultrapassou todos os obstáculos e o que hoje vemos é uma
família moderna, respeitada, usando de uma maior proximidade com os espanhóis,
não sem cumprirem as exigências decorrentes do papel que cada membro desempe-
nha, infantas incluídas, nos tempos que correm. É uma questão de sobrevivência da
própria instituição, e tal aplica-se às demais casas reais. Dos casos que o autor apre-
senta nas páginas que se seguem, será o de Charlene Wittstock o único a levantar-
-me dúvidas. O encontro de Alberto II do Mónaco com a nadadora deu-se em 2000,
no âmbito de uma competição desportiva – até aqui nada de mais –, mas o que sem-
pre me fez espécie foi ter visto uma noiva profundamente infeliz no dia do seu casa-
mento – ainda que belíssima no seu Armani –, dando corpo aos rumores que corriam
no principado de que havia sido apanhada em fuga, dois dias antes, no aeroporto de
Nice. Eu próprio ouvi a história da boca de um taxista no dia em que tudo terá acon-
tecido. Cada vez mais se fala de um negócio de milhões a sustentar um matrimónio
de fachada, o que nos remete a tempos idos e ultrapassados.
As plebeias, hoje rainhas consortes ou princesas herdeiras, trouxeram para as
famílias reais, cuja função é, pelo menos na Europa, meramente simbólica, ainda
que importante, um outro olhar e sentir da realidade, curiosamente tornando pos-
sível o «conto de fadas» tão enraizado na cultura ocidental e que a Disney tão pro-
veitosamente soube reforçar. Dêem um tutu, uma tiara e uma varinha de magicar a
uma criança e logo a verão entrar num mundo que julga apenas de brilho e de sonho.
Compreenda-se, nestas idades, o «fazer de conta» à procura de modelos. Os príncipes
e princesas ganham estatuto de heróis. Mais tarde, perceberão que são a um mesmo
tempo especiais e banais. Uma combinação única.
Republicano que sou, agrada-me pensar que qualquer um de nós pode, por
mérito e vontade popular, ascender ao lugar cimeiro do país, mas não posso negar o
fascínio, talvez infantil, que sinto sempre que sou chamado a oficiar, como apresenta-
dor, eventos reais. Pela estética, pela teatralidade, pelos rituais… Não recuso a História,
quase sempre contada pelos vencedores, procurando saber também as dos vencidos,
que é no confronto das duas que conhecemos o país que fomos. Idêntico prazer senti
ao ler as páginas que se seguem, e já agora, que estou em maré de confissões, deixe-
-me que lhe diga, também tenho uma favorita: Máxima, rainha dos Países Baixos.
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